17 de abril de 2011

Literatura: Escrita de viagens foi mote para refletir sobre o jornalismo

Matosinhos, 16 abr (Lusa) – A primeira conferência da sexta edição do Literatura em Viagem-LEV, que hoje arrancou em Matosinhos, abandonou o tema “Viajo para educar o raciocínio” e tornou-se uma reflexão sobre o jornalismo português.

O responsável pela reviravolta do guião do primeiro momento de encontro com o público do festival literário foi o jornalista Miguel Carvalho. “As viagens do jornalismo resumem-se a viagens ao Portugal sentado”, disse numa mesa redonda, onde estavam também Rui Zink, João Lopes Marques, José Ricardo Nunes, Marcelo Ferroni e o moderador Paulo Ferreira.

Miguel Carvalho recordou “um tempo em que aos jornalistas era permitido viajar para educar o raciocínio”, um tempo que está “cada vez mais esgotado”. Segundo o jornalista, "cada vez menos reproduzimos as sensações dos lugares. Tirando algumas ilhas de resistência, é cada vez menos possível essa viagem ao terreno sem protetor”, assumiu. E acrescentou, com humor, que o jornalismo que se tem feito em Portugal é o do “vá para fora cá dentro”.

De acordo com o vencedor do Grande Prémio Gazeta 2009, hoje em dia os jornalistas estão à secretária a fazer viagens no Messenger e na memória fantástica do Google. “Isto é prejudicial não só para nos, mas para quem nos lê, porque acabaram, quase de forma irremediável, as narrativas do mundo com um olhar português”, resumiu o jornalista. “O jornalismo não pode mudar o mundo, mas quem escreve deve continuar a escrever como se através da escrita pudesse mudar o mundo”, disse.

No entanto, porque é de viagens que trata o LEV, foi de viagens que João Lopes Marques, o escritor que vive na Estónia há cinco anos, mas tem a experiência de viver em “não-lugares”, falou. Numa mesa subordinada ao tema “Viajo para educar o raciocínio”, João Lopes Marques defendeu que a palavra educar “é muito forte” quando se fala em viajar, uma vez que as pessoas viajam, normalmente, para organizar e desorganizar ideias.

O escritor, que apresentou também a sua mais recente obra, “Iberiana”, é apologista da ideia de que só é possível escrever em “espaços públicos exóticos”, algo só possível graças às viagens.

Rui Zink preferiu falar, com um tom descontraído, dos vários tipos de jornadas possíveis, para terminar com “um momento à Rui Zink”, como lhe chamou Paulo Ferreira, e defender que, com a sua camisa florida, era a única pessoa “vestida adequadamente” para o evento.

A sexta edição do festival literário LEV-Literatura em Viagem começou hoje em Matosinhos, terminando na terça-feira.