28 de setembro de 2010

Acordo Ortográfico: Brasileiros vão abrir mão de muitos mais princípios do que os portugueses- linguista

Bragança, 27 set (Lusa) – O linguista brasileiro Evanildo Bechara defendeu hoje que o novo Acordo Ortográfico obriga a maiores mudanças entre brasileiros do que portugueses, contrariando a ideia de que a nova ortografia é uma adaptação ao português do Brasil.

“Pelo contrário, nós no Brasil somos obrigados a mudar muito mais os nossos hábitos do que os portugueses”, afirmou à margem da cerimónia de abertura do Colóquio Anual da Lusofonia que decorre até sábado, em Bragança.

No Brasil, “o acordo vai a pleno vapor”, garantiu o linguista, membro da Academia Brasileira de Letras, defensor da ortografia comum, mas contrário à ideia portuguesa das cedências à norma brasileira.

“O acordo faz com que os brasileiro abram mão de muitos mais princípios do que os portugueses”, afirmou, exemplificando com vários casos de acentuação, em que se destaca o trema.

Os brasileiros perderam o acento de dois pontos sobre o “u” que definia em palavras como “consequência” ou “linguiça” que a letra, normalmente, muda deve ser pronunciada.

Da mesma forma, deixam de usar o acento circunflexo sobre “voo”, “enjoo”, ou “perdoo”.

Mas para o linguista brasileiro, a maior dificuldade naquele país - também comum a Portugal - é o desaparecimento do hífen das palavras compostas, mas sem “uma regra fácil”.

“Os ortógrafos não tiveram bom senso de simplificar”, considerou, ao ditaram regras diferentes para a nova escrita de palavras como mini-saia, que agora passa a minissaia, auto-rádio a autorrádio, enquanto sub-base fica sub base.

Já para os portugueses, o linguista brasileiro encontra “uma vantagem” nas novas regras que ditam que se deixe de escrever as consoantes mudas, como já acontecia no Brasil.

“A uma criança de dez anos, a aprender a escrever, fica-lhe muito difícil entender porque é que tem de escrever Egipto com “p” quando na realidade ela não pronuncia esse “p”, já em egípcio, onde pronuncia o “p”, então ele justifica-se na escrita”, exemplificou.

Neste caso, Evanildo Bechara entende que o acordo acaba por “não obrigar o homem comum a usar uma consoante que ele não pronuncia”.

“Otimista” em relação à aplicação do acordo está também o linguista português Malaca Casteleira, embora lamente o “atraso de Portugal”, que considera justificar também o atraso em outros países lusófonos, nomeadamente africanos.

Realçou, no entanto as iniciativas em curso “favoráveis à introdução” do acordo, nomeadamente a adoção da nova escrita por parte de vários órgãos de Comunicação Social, nomeadamente a agência Lusa, o Expresso, a Visão e o Record.

Em Portugal e Brasil o novo Acordo Ortográfico deverá alargar-se aos manuais escolares já no próximo ano letivo.

Os dois linguistas vão estar disponíveis para responder a perguntas sobre a nova escrita no nono Colóquio Anual da Lusofonia em que são esperados meia centena de oradores de diferentes países.