Lisboa, 07 nov (Lusa) - Um jovem português de 33 anos conseguiu criar em laboratório o primeiro fígado humano. Pedro Baptista, responsável pela equipa do instituto norte-americano que fez a investigação, pretende criar órgãos para transplante humano.
Muito mais pequeno do que um fígado humano (cerca de dois quilos), o órgão criado no laboratório de Medicina Regenerativa da Universidade de Wake Forest tem apenas 2,5 centímetros de diâmetro e pesa pouco mais de cinco gramas.
Pedro Baptista garante que aquele tecido “possui muitas das funções que o fígado tem”, mas agora é preciso descobrir a fórmula certa para o fazer crescer.
A equipa de investigadores vai começar a fazer transplantes em ratos de laboratório.
“Se as coisas correrem bem nos ratos, ou seja, se o órgão tiver a função que nós esperamos, então começaremos a tentar aumentar o seu tamanho e o transplante numa espécie maior”, explica o jovem investigador.
O objetivo final é conseguir criar um órgão capaz de ser transplantado para os humanos. Pedro Baptista acredita que essa poderia ser uma realidade dentro de “cinco a dez anos”, mas lembra que tudo está “dependente dos recursos e de como as coisas vão correndo”.
“Infelizmente, nem sempre acontece como queremos. Em ciência é sempre complicado fazer previsões, especialmente quando podem lançar alguma esperança em doentes terminais”.
O investigador sublinha que “este é um passo importante para os doentes porque são os primeiros fígados alguma vez feitos em laboratório que têm função de um fígado humano”, lembrando que “já outros grupos tinham conseguido fazer fígados, mas apenas com células animais” .
A descoberta poderá ser também importante para atestar a segurança de novos medicamentos: “Para o estudo do metabolismo de drogas e de toxicidade de químicos faz mais sentido usar este tipo de tecido, com células humanas, do que os tecidos de células animais, porque nem sempre os órgãos animais metabolizam as drogas e os químicos da mesma maneira do que os humanos”, explica.
Apoiado no último ano por estudantes da universidade, Pedro Baptista publicou a sua investigação no jornal “Hepatology”.
Aos 27 anos, o investigador português Pedro Baptista deixou a empresa onde fazia ensaios clínicos e rumou para os Estados Unidos atrás do sonho de fazer investigação, que encontrou no Instituto de Medicina Regenerativa, onde criou o primeiro fígado humano.
“O meu sonho sempre foi fazer investigação ao mais alto nível”, contou à Lusa o jovem de 33 anos, que criou fígado humano no laboratório de Medicina Regenerativa da Universidade de Wake Forest.
Os dias de Pedro Baptista são passados a “fazer experiências ou a escrever”.
“Normalmente, como sou português, não me levanto muito cedo”, disse o jovem cientista, acrescentando que o despertar é “por volta das oito da manhã”. Mas só chega ao instituto às 10:00. É que é em casa que lê os artigos que lhe interessam e que gosta de planear as experiências que vai fazer.
“Os dias normais são de dez, onze ou doze horas. Quando realmente há muito trabalho é que é mais complicado”, reconheceu o investigador que não recebe horas extraordinárias mas também não sente “o tempo passar" quando está no laboratório.
Com formação básica em ciências farmacêuticas, Pedro sempre quis fazer investigação em medicina regenerativa do fígado, por ser “o primeiro órgão a metabolizar drogas e medicamentos”, explicou.
Em 2002, fazia ensaios clínicos numa empresa farmacêutica quando soube do programa da Gulbenkian de doutoramento em biomedicina. Conseguiu uma bolsa de doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia e escolheu o Instituto de Medicina Regenerativa.
A opção não foi casual: “Daqui saiu, em 2001, o primeiro órgão feito em laboratório alguma vez implantado em humanos: a bexiga”.
Agora, graças ao seu trabalho, o instituto acrescenta mais uma vitória na área da investigação ao conseguir criar também o primeiro fígado humano.
Pedro Baptista não esquece o momento em que percebeu que o seu trabalho estava “no caminho certo”, quando viu ao microscópio que as células hepáticas se estavam a diferenciar nos vários tipos celulares do fígado.
“Foi fantástico. A ciência também tem muitas horas de frustração e quando estas coisas acontecem é sempre um motivo de orgulho e de satisfação. Enfim, é a sensação do objetivo alcançado”, recordou.
Pedro Baptista ainda tem outras metas que pretende alcançar: “Aquilo que mais desejo é conseguir fazer o transplante para os ratos, mas não sei se depois vou continuar aqui ou não”, desabafou, explicando que “o transplante para os humanos ainda vai demorar muito tempo” e o cientista tem “saudades de casa, da família e dos amigos”.
Mas uma coisa é certa: “Enquanto não tentar o transplante que é o que eu estou a fazer não vou arredar pé daqui”.