13 de fevereiro de 2010

Os vinhos portugueses e a ignorância dos estrangeiros

Interessante crónica de Edgardo Pacheco na revista Sábado :

Destinada a promover os vinhos portugueses nos mercados externos, o lançamento, esta semana, da marca Wines of Portugal explora um conceito fundamental: a world of diference. Finalmente, depois de décadas de discussão e rios de dinheiro gasto em estudos internacionais, parece ser consensual que a mais-valia do país são as castas autóctones e não a produção de vinhos provenientes de meia dúzia de variedades internacionais, feitos à imagem e semelhança de refrigerantes famosos. Ou seja, contra os syrahs, cabernets, pinots, merlots, chardonnays, sauvignon blancs, viogniers ou chenin blancs, o país tem de competir com as castas Touriga Nacional, Trincadeira, Aragonês, Baga (sim a Baga), Castelão em terras de areias, Arinto, Alvarinho, Maria Gomes, Antão Vaz, Bical, Encruzado, Gouveio e por aí fora.

Os nomes das castas portuguesas são difíceis de pronunciar por um estrangeiro? É verdade. Portugal tem boa imagem no exterior? Claro que não? É plausível que um inglês a trabalhar na City vá a uma garrafeira comprar vinho português para um jantar em casa dos amigos? É pouco plausível. O mais certo é levar um Syrah australiano, chileno ou argentino. Sim, porque aparecer em casa dos amigos com um produto português, só se for para provocar.

Ainda assim, Portugal não tem outra hipótese que não desenvolver estratégias de comunicação e marketing para realçar as virtudes das nossas castas, até porque, aos poucos, os consumidores internacionais vão querer provar vinhos diferentes, vão fartar-se de alguns xaropes de fruta e perfumes de carvalho. Em provas cegas, muitos manifestam esse desejo. O problema é que quando chegam à prateleira optam pelo seguro, nunca pelo desconhecido.
Ora, consta que a campanha Wines of Portugal tem 50 milhões de euros para investir. Acho bem, mas se calhar não seria má ideia gastar algum dinheiro com os jornalistas estrangeiros que escrevem sobre vinhos, convidando-os a passar cá um mês, no mínimo. Deixá-los livremente para que pudessem ir do Minho à Madeira. É que, parte dos nossos problemas deve-se à ignorância daqueles que sobre nós escrevem. Vejam lá estes exemplos.

Matt Skinner é wine writer (eles identificam-se assim) da Gourmet Traveller, publicação muito lida no mundo anglo saxónico. Em artigo recente escreveu sobre as 10 cidades mais importantes a visitar para comer e provar vinhos. Isto para o ano de 2010. São elas Verona, Hong-Kong, Berlim, Amesterdão, Tokyo, Montreal, Copenhaga, Madrid, Buenos Aires e Wellington (Nova Zelândia).

Não é nossa intenção nossa meter o bedelho nos gostos no wine writer australiano, mas, sentado em Lisboa, um tipo esfrega as têmporas e faz um esforço para imaginar onde se pode fazer uma refeição fora de série (na combinação vinhos/comida) em Copenhaga, Amesterdão ou até Berlim. Uma refeição, note-se, que tenha a ver com a matriz gastronómica local (não falamos da criatividade de chefes estrelados). Mais, em matéria de vinhos, o que se beberá nestas cidades? Os mesmos caldos feitos na Austrália, na Nova Zelândia, África do Sul, Chile e Argentina. Em algum dos 10 destinos pode-se, num mesmo restaurante, provar vinhos verdes, brancos tranquilos, tintos, portos, moscatéis ou madeiras? Em nenhum.

Pior do que isto só a selecção do conceituado The Guardian sobre os melhores locais do mundo para comer determinados produtos. Quando se chegou ao capítulo do peixe, que país foi escolhido? Apetecia dizer que a resposta certa valeria uma Barca Velha. Pois foi a Irlanda. A Irlanda, não é erro. Portugal foi descrito como o melhor destino para se comer pastéis de nata. Nem mais. Já agora, há pastéis de nata noutros países? Evidentemente que não existe má fé nestas duas situações. Há, simplesmente, muita ignorância. E é aqui que se devia investir algum dinheiro. É barato e dá resultados.